quarta-feira, março 28, 2007

Não sabia…

Não sabia que te amava…
Nem o sonhei durante minutos em que não dormia.
Via Fadas e Duendes, mas os Pós de alguma Magia,
não me fizeram suspeitar de um arco-íris que me perseguia!

Claro que não era normal. Até no dia mais bonito e azul do ano,
lá estava ele esperando a um canto, por de trás de qualquer colina.
Nessa altura devia ter percebido. E devia ter corrido por um pote,
que não era de ouro mas de sonho e muita vontade.

Hoje, grito à distância, para que me oiças e sintas. Amo-te!!
Amo-te mil vezes e mais do que possa suportar.
Escrevo versos antigos e gastos, e desejos de te abraçar, nada mais simples…
Sem exageros de poesia ou ambição literária. Apenas pequeninos arrepios.

Quero-te sem te poder resgatar de outras torres já faladas,
mas confiando num olhar com poderes irresistíveis.
Chamo pelo teu nome, guardo esperanças e feitiços,
cerro punhos e lábios em esforço, por tão querer…

Ter-te-ei em sonhos ou nos meus braços!
Por já me sentir tão perto, guardo as últimas pulsações,
e já sorrindo de infinita alegria,
Observo a pequena folha cair no lago…


(texto antigo de emoções já perdidas)

quarta-feira, março 21, 2007

O Monstro e a Lua…

Eram tempos difíceis e em que raramente os dias nasciam belos e cheirando a terra molhada. O orvalho tinha há muito secado nas infinitas planícies, e as enormes árvores que formavam a floresta ameaçavam tombar de fraqueza e desespero.
Existiam duas pequenas aldeias ali perto, que tinham o vigor das suas gentes e almas, e pareciam continuar a envelhecer muito lentamente.
Não eram rivais, nem sequer muito distantes, sendo separadas apenas por um rio de águas tranquilas e mais uns hectares de terras férteis cultivadas.
A maior aldeia, Ornae, era a mais antiga e os seus habitantes pertenciam a famílias ancestrais que ali viveram por muito tempo. Na outra aldeia Kermea, vivia um povo estrangeiro que ali havia chegado muito depois, e com a autorização dos locais se estabeleceram do outro lado do rio. Estranho era não existirem nomes para os dois povos. Ambos usavam o nome da aldeia como apelido, e para nome próprio, escolhiam estranhos sussurros que pareciam esconder-se de qualquer ouvido.
A floresta ficava para Oeste das aldeias, onde o rio nascia e trazia a sombra da noite, quando o Sol se deitava nas árvores seculares.
E então chegava o medo! Diziam os de Ornae, que na floresta habitava um Monstro horrível e violento, que matava quem ousasse entrar nos seus domínios. Certo era que ninguém o tinha visto alguma vez e mesmo os ruídos que por vezes ecoavam, podiam facilmente ser de outro qualquer animal ou apenas o vento derrubando uma velha árvore. Mas a lenda permaneceu e também Kermea não dormia em paz, pensando que o ser maldito atacaria as suas casas e mataria famílias inteiras.
Diziam os mais velhos, que apenas um segredo o impedia de atacar as aldeias. O Monstro tinha medo da Lua! A razão para tal temor era até muito simples. As árvores na floresta eram muito altas e de vegetação densa. Mesmo em noites de Lua cheia, a sua luz passava com dificuldade até ao solo e quando o conseguia, filtrada por inúmeros ramos e folhas, chegava em forma de finos raios brancos que a besta pensava serem mortais, fugindo deles para sobreviver. Na orla da floresta, os ramos eram menos densos e os raios da Lua formavam um imaginário conjunto de grades, que o impediam de sair do seu refúgio.
As noites sem Lua eram passadas a recuperar os sonos perdidos e a reforçar abrigos de espessa folhagem no centro da floresta, que o protegeriam quando ela voltasse.
Muitos ciclos de Lua se passaram neste frágil equilíbrio, até que as duas aldeias ficassem finalmente em real perigo.
Na sua obsessão de esconder a Lua, o Monstro foi tapando todos os espaços por entre as árvores e durante o dia também o Sol era incapaz de penetrar. Em certa altura, até mesmo a água da chuva não conseguia chegar ao solo e a terra começou a secar, ficando dura como pedra e com enormes rachas que serpenteavam. Sem água e a luz do Sol, a floresta adoeceu e começou a definhar, e em todas as noites estalavam ramos e caiam no solo enormes árvores que desistiam de viver.
O medo apareceu então para os habitantes da aldeia. Sabiam que estava para breve o colapso da floresta e que o Monstro perceberia que a luz da Lua não tinha poderes para o matar, ou sequer magoar e que tal crença não passava de um engenhoso truque, que provavelmente os antepassados dos que viviam em Ornae tinham criado para sua protecção.
Mas agora o tempo escasseava e os habitantes das duas aldeias temiam pelo pior. Quebrando a conduta habitual, convocaram uma reunião de anciães de quem se esperava uma solução para a ameaça. Ornae e Kermea uniram assim, pela primeira vez, esforços que nada tinham a ver com a sua organização territorial, mas por questões da sua própria sobrevivência.
O local escolhido foi um pequeno coreto que existia no centro da ponte e que só uma vez tinha sido usado, no centenário de yntik, patriarca de Ornae e dos poucos cujo nome pode ser minimamente traduzido ou pronunciado.
Num círculo de bancos de pedra juntaram-se seis membros de cada aldeia, rodeando yntik, no centro, cumprindo o papel de moderador.
Durante horas conversaram calmamente (ambos os povos não apreciavam discussões acaloradas), tentando descobrir uma saída para o problema. Fugir estava fora de questão, pois esta era a única zona fértil conhecida e ninguém tinha coragem de partir.
A planície onde viviam, era como um Oásis que estava situada no centro de um horizonte sem fim, sem vegetação e coberta por uma crosta seca e aterradora sem quaisquer sinais de vida.
Perante o silêncio e desânimo geral, um dos anciães levantou-se e colocou-se junto da pedra do centro. Parecia ser de Kermea e observado pelos restantes começou a retirar o enorme lenço que lhe cobria a face e que cujo uso era obrigatório quando os habitantes das duas aldeias se encontravam. Para espanto geral era um jovem de Ornae.
Era bem conhecido por ser neto de um dos anciães mais respeitados e que naquela noite não comparecera por estar gravemente doente. O rapaz inclinou-se perante os membros do Conselho, aguardando a sua tolerância e permissão para falar.
Yntik sorriu e pediu-lhe que transmitisse os seus pensamentos. O plano era simples. Consistia em usar os fogos sagrados, arremessando-os para o centro da floresta onde, com sorte, surgiria um incêndio que destruiria as protecções construídas pelo Monstro, deixando a luz da Lua entrar com todo o seu brilho e esplendor. Este morreria pela acção dos raios que evitou durante séculos, pois não tinha por onde fugir. O silêncio foi profundo. Todos tinham a certeza de que a lenda não passava disso mesmo e a Lua seria tão inofensiva para o Monstro como o era para os humanos. Desanimados e zangados com a intromissão do rapaz, os anciães regressaram a suas casas deixando os seus mantos no coreto, desistindo de encontrar uma solução.
O rapaz ali ficou, chorando de raiva, sem conseguir agora reprimir uma vontade de crescer nos sonhos e nas crenças que há muito guardava.
Sem que alguém soubesse era dos poucos que se aproximava da floresta e mesmo assim só quando a Lua estava bem cheia e os seus raios lhe traziam segurança e ambição. Junto às primeiras árvores deitava-se bem escondido e ficava a ouvir…
Escutava os passos pesados do Monstro, os seus gritos de terror perante um inesperado raio de Lua que passava por entre ramos quebradiços, e conseguia até sentir um leve odor a queimado que imaginava ser a pelugem do animal, numa agressão enfeitiçada da luz que partia a grande velocidade do satélite distante.
Por tudo isto continuou a chorar, pela sábia ignorância de velhos não crentes, mas pior do que tudo, por temer também ele deixar de acreditar.
yntik preparava-se para se deitar. Estava exausto e muito assustado. Não conseguia afastar a imagem da face do jovem entusiasmado com uma solução mágica e absurda em que não conseguia acreditar. Não era possível que a lenda fosse real. Estava quase a adormecer quando ouviu um enorme estrondo. A aldeia iluminou-se como se o dia pudesse chegar mais cedo. Abriu a janela do seu quarto e paralisou com o cenário que os seus velhos olhos vislumbraram. Uma quantidade enorme de fogos sagrados explodiam ruidosamente e disparavam a grande velocidade, na direcção da floresta. Durante breves minutos, todo o armazém onde eram guardados foi esvaziado do seu conteúdo e logo as chamas começaram a nascer no centro da floresta. O fogo aumentou de dimensão e consumiu por completo enormes árvores que começaram a cair. O jovem, já quase desistindo da sua crença, não conseguira resistir a um impulso sem explicação, mas que instintivamente o levou a agir.
O que os anciães não sabiam, era que o rio nascia precisamente nessa parte central da floresta, numa pequena lagoa circular, último reduto de vida na Natureza já moribunda. Mesmo no meio ficava uma ilha onde morava o Monstro, que ao primeiro sinal de fogo mergulhara na água fria. Esse círculo, que o rapaz conhecia, impediu que o fogo alastrasse ao resto das árvores, criando apenas uma clareira que agora deixava a luz da Lua entrar, reflectida magicamente na água que corria naquele local. O Monstro tremeu ao sentir o ar desaparecer dos seus pulmões e, preparado para finalmente encontrar o seu destino, começou lentamente a sair de dentro da lagoa. Fechou os seus olhos estranhamente tranquilos e mansos, esperando a dor e o queimar da sua alma. Então, começou a sentir algo distante da dor ou do medo e com um súbito arrepio pela primeira vez experimentado, abriu os olhos devagar. No alto, brilhante e mais linda do que nunca, a Lua parecia querer acalmá-lo e lançou encantos que desceram, enfeitiçando um coração afinal tão calmo.
A partir desse dia, o Monstro apaixonado começou a cuidar da sua floresta deixando que Sol e Lua entrassem gentilmente.
As aldeias puderam viver em paz e o velho ancião sorriu de novo, pela alegria de ainda aprender.

terça-feira, março 13, 2007

O regresso...

Um dia, vários anos depois, regressei aquele lago com que sonhara todas as noites desde que partira.
Ao chegar notei que a vegetação em redor era agora muito mais densa e só usando a minha espada consegui avançar lentamente. Os meus olhos viram, e não consegui fugir de uma realidade que me fez parar e cair de joelhos.
A torre, outrora pequena e ridícula, era agora imponente, passando as nuvens em altura e desafiando os ventos que a agrediam. Estava envolta num emaranhado de plantas trepadeiras espinhosas, de aspecto velho e aterrador.
Olhei para o alto, mas era impossível saber se a minha Princesa continuava na varanda, pois a névoa era espessa e negra, perturbando a minha visão.
Furioso, desembainhei novamente a espada, e comecei a cortar as trepadeiras e espinhos que envolviam a torre. Durante horas, cortei e arranquei com as próprias mãos, aquela Natureza feia que me impedia de subir ao meu destino.
Por fim, completamente exausto, e perto do descontrolo, larguei a espada e iniciei uma escalada de impulso, ignorando a dor profunda que sentia enquanto os espinhos rasgavam a minha roupa e pele, a cada metro que avançava.
Estava já muito perto da varanda, mas não conseguia ver o que me esperava.
Por fim, consegui alcançar o topo da torre e parei durante uns segundos para recuperar, em vão, o fôlego e as forças.
Então, sem que pudesse resistir, ou agarrar-me a qualquer esperança, escorreguei e mergulhei com vertigem para o chão distante. Fechei os olhos e desejei que tudo acabasse depressa. Talvez, a sorte me fizesse cair em cima da espada que deixara cravada na terra molhada. Morreria de forma mais digna e combatendo, não contra dragões ou negros exércitos, mas por algo igualmente nobre.
Foi com espanto que o meu mergulho se transformou num pequena queda, incapaz de provocar um simples arranhão. Sem que percebesse, a torre voltara ao seu tamanho inicial, pequena e já sem quaisquer névoas a envolvê-la.
Estava deitado de costas num manto daquelas folhas que enchiam agora o lago por completo, à excepção de uma ínfima parcela que deixava a água brilhar reflectindo a luz do Sol. Esse espaço por preencher, tinha as medidas exactas de uma única folha e esperava que a mesma brisa mágica, o cobrisse finalmente.
Levantei-me e olhei para a varanda, onde encontrei a Princesa dos meus sonhos, desta vez sorrindo e sem procurar fingir que me observava. Nos cabelos não restavam folhas, mas nas mãos guardava apenas uma, que poderia caber na perfeição no último espaço que restava no lago.
Era a mesma folha que lhe tinha deixado quando ali estivera e em que agora recaía uma imensa responsabilidade.
Sorri e afastei-me um pouco, para me sentar numa sombra calma não muito longe dali.
Esperaria tranquilo, com a certeza de que o destino depressa revelaria os seus segredos, afastando ventos difíceis e tempestuosos.
Dormi com um sorriso mais doce e aguardei a minha sorte…