domingo, julho 22, 2007

Nas tuas mãos...

Só queria voar contigo.
Juntar pequenos dedos com medo de se tocarem.
Partir em velocidade rasando Igrejas.
Ficar agarrado a um vento e com medo de cair.

Estranho é ainda sonhar que voamos,
enquanto as tuas mãos lutam por se separar.
Se me largasses seria livre para descer em queda.
Para mergulhar com um destino tão certo e cego.

Apertei mais por um momento, sentindo pouca resistência.
Lutei por esquecer os sinais que me fariam desistir.
Um dia lembraria que o toque nunca é assim...
Jamais poderia saber a que sabia este rasgar...

Larguei-te há pouco tempo e comecei a voar.
Não me senti perseguido, nem por um pequeno pássaro.
Descia devagar, sorrindo pelas nuvens que afinal são densas.
E ao aproximar-me do fim recomecei a apertar...
as tuas mãos que poderia recordar.

quarta-feira, junho 06, 2007

A Lua...

Um dia caminhava sem destino.
Quase sem perceber, leve e silenciosa chegaste a meu lado.
Tempos passaram, até que pudesse olhar, falar, até pensar…
Olhos beijaram-me e a boca falou sem que ouvisse.

A pele era perfumada enquanto gotas de água desciam devagar num peito já ofegante. Devo ter perdido os sentidos por séculos e ao voltar a mim, vi sorrindo que não sonhava.
Sem saber porquê, estendi a mão para que te tocasse.
Primeiro leve nos cabelos, que queriam cobrir a face.
Depois roubando ao peito as gotas que rebentavam.

Quando parei era noite e a Lua, deitada sobre uma pequena nuvem, parecia querer falar.
Protegido por ela segui caminho, agora só.
Senti ciúme lá do alto, de quem deseja ser mulher.
Senti perfume nas mãos, de quem me faz sonhar.

Parei de repente, olhei em redor e nada vi!
Só um penhasco altivo e orgulhoso inclinado sobre o mar.
Corri para o vento e já sobre as ondas, gritei sem um único som.
Abracei a Lua e por ela chorei.

Por um momento juro que voei e só então te amei, num segundo breve e gasto.

segunda-feira, maio 14, 2007

Noite…

Só, calmo e ansioso,
Procurava-te com o olhar.
Durante anos perto do mar,
À noite perto de mim!

Com um sorriso e depois sem ele.
Com mágoa, paixão e desespero,
chegaste perto de mim,
nessa noite fria e escura.

Quase sofri, quase chorei,
contive o meu peito e sonhei…
com estrelas, com morte e sem paz.

Rasgo de dor, choro de amor,
Corro caminhos sem os encontrar.

Subitamente paro e escuto a tua voz!
tremendo, encontro as tuas mãos
e sinto a sua pele.

Posso morrer, podia sofrer e nada sentia.
Só a memória deste momento,
que guardo doce e terno
e me deixa viver sem ti.

segunda-feira, abril 30, 2007

Veludo...

Não me recordo do toque do veludo. Lembra-me mais um som do que outra sensação. Talvez pela música...talvez por outras memórias...

De muito pouco vale ceder a uma tristeza que nos procura. Cada um de nós tem que esquecer o que tanto o faz sofrer. Parece e pode ser fácil, porque vamos encontrando pequenos momentos de felicidade. E ganhando coragem para continuar.

Preciso fazer um considerável esforço para recordar tudo o que aconteceu. Parecia ainda que não podia falar ou sequer escrever sobre a minha vida, mas ela a isso me obriga. A vida que não troco nem mudo, embora às vezes o deseje.

Um dia, de forma tão simples e pouco original, simplesmente trocámos um olhar. E sentimos que entre olhos do mesmo tom se tinham estendido tantas palavras. E depois o tempo foi passando até que pudesse encher-me de um quase atrevimento.

Confesso que com habilidade consegui saber o que não esperava e portanto não assustava.

sexta-feira, abril 20, 2007

Pensando…

Os pensamentos chocam com estrondo, avançando por pequenas vielas, patrulhadas por velhas…tão velhas e gatos vadios incapazes de os deter.
Chegam à luz e logo se escondem por de trás de sombras acinzentadas com enormes grilhões cobertos de ferrugem.

É inútil, porque logo fogem, disparando horizonte a cima, raspando pequenas folhas e soltando gotas orvalhadas quase em evaporação. Lá no alto encontrei o teu toque, a doce lembrança de um abraço, um beijo cheio de medo e felicidade, um sorriso de deslumbre que me leva para os sonhos.

Teimo em não querer descer e enfrentar os outros demónios que me aguardam e a uma explicação…um argumento para tanto amor, tantos impulsos e actos.

Gritar ajuda e faço-o de peito quase explodindo de sinceridade. Na ausência de flechas e outras armas, combato com o olhar e espero…

segunda-feira, abril 09, 2007

A rapariga de caracóis...

Se pudesse rir tinha a certeza que o faria até me doerem os músculos da barriga. Mas a vontade é de soltar sorrisos que me mantêm a baloiçar sem saber o que fazer.
Há dois dias reparei que a minha colega de trabalho tinha imensos caracóis. Seria estranho e até pouco usual, que só ao fim de meses pensasse nisto. Mas eram mesmo muitos e a cada minuto parecia que aumentavam.
Parei de trabalhar, como faço frequentemente, e pus-me a observar enquanto falava. E foi então que começou. Certas plantas, se não forem regadas, ficam com as folhas muito fracas e ao perderem vigor, começam a escorregar para junto de um vaso ou da terra. Se lhe devolvermos a água, de imediato as folhas começam a mexer-se e a levantarem-se contra a ideia de imobilidade que tantas vezes temos destes seres.
Com os caracóis da minha colega...parecia que acontecia o mesmo. Notei que, enquanto falávamos, a cada minuto que passava uma madeixa de cabelos encaracolava subitamente. De início pensei não estar a ver bem, mas ao fim de dez minutos comecei a transpirar de nervosismo. Com um relógio, controlei ao segundo o tempo que separava estes momentos e logo tive a certeza. Ao fim de exactamente sessenta segundos, lá ia mais um pedaço de cabelo para cima, encaracolando de forma rápida e tão perfeita.
Depois, parei de conversar, e os caracóis pararam também. Se continuasse calado muito tempo os outros começavam a estender-se anulando a forte ondulação que já tinham formado. Comecei de novo a falar!
Durante quase uma hora não me permiti a um meio segundo de silêncio. Os caracóis formavam-se cada vez mais rápido. Partiam a grande velocidade para o alto, unindo-se aos que já haviam feito o mesmo percurso.
A minha colega ganhava um lindo sorriso, percebendo-se diferente.
Quando já não haviam mais madeixas para encaracolar, continuei a conversar, rindo e contando histórias antigas. Os caracóis riam também e agradeceram a voz que os protegeu e fez de novo viver.

quarta-feira, março 28, 2007

Não sabia…

Não sabia que te amava…
Nem o sonhei durante minutos em que não dormia.
Via Fadas e Duendes, mas os Pós de alguma Magia,
não me fizeram suspeitar de um arco-íris que me perseguia!

Claro que não era normal. Até no dia mais bonito e azul do ano,
lá estava ele esperando a um canto, por de trás de qualquer colina.
Nessa altura devia ter percebido. E devia ter corrido por um pote,
que não era de ouro mas de sonho e muita vontade.

Hoje, grito à distância, para que me oiças e sintas. Amo-te!!
Amo-te mil vezes e mais do que possa suportar.
Escrevo versos antigos e gastos, e desejos de te abraçar, nada mais simples…
Sem exageros de poesia ou ambição literária. Apenas pequeninos arrepios.

Quero-te sem te poder resgatar de outras torres já faladas,
mas confiando num olhar com poderes irresistíveis.
Chamo pelo teu nome, guardo esperanças e feitiços,
cerro punhos e lábios em esforço, por tão querer…

Ter-te-ei em sonhos ou nos meus braços!
Por já me sentir tão perto, guardo as últimas pulsações,
e já sorrindo de infinita alegria,
Observo a pequena folha cair no lago…


(texto antigo de emoções já perdidas)

quarta-feira, março 21, 2007

O Monstro e a Lua…

Eram tempos difíceis e em que raramente os dias nasciam belos e cheirando a terra molhada. O orvalho tinha há muito secado nas infinitas planícies, e as enormes árvores que formavam a floresta ameaçavam tombar de fraqueza e desespero.
Existiam duas pequenas aldeias ali perto, que tinham o vigor das suas gentes e almas, e pareciam continuar a envelhecer muito lentamente.
Não eram rivais, nem sequer muito distantes, sendo separadas apenas por um rio de águas tranquilas e mais uns hectares de terras férteis cultivadas.
A maior aldeia, Ornae, era a mais antiga e os seus habitantes pertenciam a famílias ancestrais que ali viveram por muito tempo. Na outra aldeia Kermea, vivia um povo estrangeiro que ali havia chegado muito depois, e com a autorização dos locais se estabeleceram do outro lado do rio. Estranho era não existirem nomes para os dois povos. Ambos usavam o nome da aldeia como apelido, e para nome próprio, escolhiam estranhos sussurros que pareciam esconder-se de qualquer ouvido.
A floresta ficava para Oeste das aldeias, onde o rio nascia e trazia a sombra da noite, quando o Sol se deitava nas árvores seculares.
E então chegava o medo! Diziam os de Ornae, que na floresta habitava um Monstro horrível e violento, que matava quem ousasse entrar nos seus domínios. Certo era que ninguém o tinha visto alguma vez e mesmo os ruídos que por vezes ecoavam, podiam facilmente ser de outro qualquer animal ou apenas o vento derrubando uma velha árvore. Mas a lenda permaneceu e também Kermea não dormia em paz, pensando que o ser maldito atacaria as suas casas e mataria famílias inteiras.
Diziam os mais velhos, que apenas um segredo o impedia de atacar as aldeias. O Monstro tinha medo da Lua! A razão para tal temor era até muito simples. As árvores na floresta eram muito altas e de vegetação densa. Mesmo em noites de Lua cheia, a sua luz passava com dificuldade até ao solo e quando o conseguia, filtrada por inúmeros ramos e folhas, chegava em forma de finos raios brancos que a besta pensava serem mortais, fugindo deles para sobreviver. Na orla da floresta, os ramos eram menos densos e os raios da Lua formavam um imaginário conjunto de grades, que o impediam de sair do seu refúgio.
As noites sem Lua eram passadas a recuperar os sonos perdidos e a reforçar abrigos de espessa folhagem no centro da floresta, que o protegeriam quando ela voltasse.
Muitos ciclos de Lua se passaram neste frágil equilíbrio, até que as duas aldeias ficassem finalmente em real perigo.
Na sua obsessão de esconder a Lua, o Monstro foi tapando todos os espaços por entre as árvores e durante o dia também o Sol era incapaz de penetrar. Em certa altura, até mesmo a água da chuva não conseguia chegar ao solo e a terra começou a secar, ficando dura como pedra e com enormes rachas que serpenteavam. Sem água e a luz do Sol, a floresta adoeceu e começou a definhar, e em todas as noites estalavam ramos e caiam no solo enormes árvores que desistiam de viver.
O medo apareceu então para os habitantes da aldeia. Sabiam que estava para breve o colapso da floresta e que o Monstro perceberia que a luz da Lua não tinha poderes para o matar, ou sequer magoar e que tal crença não passava de um engenhoso truque, que provavelmente os antepassados dos que viviam em Ornae tinham criado para sua protecção.
Mas agora o tempo escasseava e os habitantes das duas aldeias temiam pelo pior. Quebrando a conduta habitual, convocaram uma reunião de anciães de quem se esperava uma solução para a ameaça. Ornae e Kermea uniram assim, pela primeira vez, esforços que nada tinham a ver com a sua organização territorial, mas por questões da sua própria sobrevivência.
O local escolhido foi um pequeno coreto que existia no centro da ponte e que só uma vez tinha sido usado, no centenário de yntik, patriarca de Ornae e dos poucos cujo nome pode ser minimamente traduzido ou pronunciado.
Num círculo de bancos de pedra juntaram-se seis membros de cada aldeia, rodeando yntik, no centro, cumprindo o papel de moderador.
Durante horas conversaram calmamente (ambos os povos não apreciavam discussões acaloradas), tentando descobrir uma saída para o problema. Fugir estava fora de questão, pois esta era a única zona fértil conhecida e ninguém tinha coragem de partir.
A planície onde viviam, era como um Oásis que estava situada no centro de um horizonte sem fim, sem vegetação e coberta por uma crosta seca e aterradora sem quaisquer sinais de vida.
Perante o silêncio e desânimo geral, um dos anciães levantou-se e colocou-se junto da pedra do centro. Parecia ser de Kermea e observado pelos restantes começou a retirar o enorme lenço que lhe cobria a face e que cujo uso era obrigatório quando os habitantes das duas aldeias se encontravam. Para espanto geral era um jovem de Ornae.
Era bem conhecido por ser neto de um dos anciães mais respeitados e que naquela noite não comparecera por estar gravemente doente. O rapaz inclinou-se perante os membros do Conselho, aguardando a sua tolerância e permissão para falar.
Yntik sorriu e pediu-lhe que transmitisse os seus pensamentos. O plano era simples. Consistia em usar os fogos sagrados, arremessando-os para o centro da floresta onde, com sorte, surgiria um incêndio que destruiria as protecções construídas pelo Monstro, deixando a luz da Lua entrar com todo o seu brilho e esplendor. Este morreria pela acção dos raios que evitou durante séculos, pois não tinha por onde fugir. O silêncio foi profundo. Todos tinham a certeza de que a lenda não passava disso mesmo e a Lua seria tão inofensiva para o Monstro como o era para os humanos. Desanimados e zangados com a intromissão do rapaz, os anciães regressaram a suas casas deixando os seus mantos no coreto, desistindo de encontrar uma solução.
O rapaz ali ficou, chorando de raiva, sem conseguir agora reprimir uma vontade de crescer nos sonhos e nas crenças que há muito guardava.
Sem que alguém soubesse era dos poucos que se aproximava da floresta e mesmo assim só quando a Lua estava bem cheia e os seus raios lhe traziam segurança e ambição. Junto às primeiras árvores deitava-se bem escondido e ficava a ouvir…
Escutava os passos pesados do Monstro, os seus gritos de terror perante um inesperado raio de Lua que passava por entre ramos quebradiços, e conseguia até sentir um leve odor a queimado que imaginava ser a pelugem do animal, numa agressão enfeitiçada da luz que partia a grande velocidade do satélite distante.
Por tudo isto continuou a chorar, pela sábia ignorância de velhos não crentes, mas pior do que tudo, por temer também ele deixar de acreditar.
yntik preparava-se para se deitar. Estava exausto e muito assustado. Não conseguia afastar a imagem da face do jovem entusiasmado com uma solução mágica e absurda em que não conseguia acreditar. Não era possível que a lenda fosse real. Estava quase a adormecer quando ouviu um enorme estrondo. A aldeia iluminou-se como se o dia pudesse chegar mais cedo. Abriu a janela do seu quarto e paralisou com o cenário que os seus velhos olhos vislumbraram. Uma quantidade enorme de fogos sagrados explodiam ruidosamente e disparavam a grande velocidade, na direcção da floresta. Durante breves minutos, todo o armazém onde eram guardados foi esvaziado do seu conteúdo e logo as chamas começaram a nascer no centro da floresta. O fogo aumentou de dimensão e consumiu por completo enormes árvores que começaram a cair. O jovem, já quase desistindo da sua crença, não conseguira resistir a um impulso sem explicação, mas que instintivamente o levou a agir.
O que os anciães não sabiam, era que o rio nascia precisamente nessa parte central da floresta, numa pequena lagoa circular, último reduto de vida na Natureza já moribunda. Mesmo no meio ficava uma ilha onde morava o Monstro, que ao primeiro sinal de fogo mergulhara na água fria. Esse círculo, que o rapaz conhecia, impediu que o fogo alastrasse ao resto das árvores, criando apenas uma clareira que agora deixava a luz da Lua entrar, reflectida magicamente na água que corria naquele local. O Monstro tremeu ao sentir o ar desaparecer dos seus pulmões e, preparado para finalmente encontrar o seu destino, começou lentamente a sair de dentro da lagoa. Fechou os seus olhos estranhamente tranquilos e mansos, esperando a dor e o queimar da sua alma. Então, começou a sentir algo distante da dor ou do medo e com um súbito arrepio pela primeira vez experimentado, abriu os olhos devagar. No alto, brilhante e mais linda do que nunca, a Lua parecia querer acalmá-lo e lançou encantos que desceram, enfeitiçando um coração afinal tão calmo.
A partir desse dia, o Monstro apaixonado começou a cuidar da sua floresta deixando que Sol e Lua entrassem gentilmente.
As aldeias puderam viver em paz e o velho ancião sorriu de novo, pela alegria de ainda aprender.

terça-feira, março 13, 2007

O regresso...

Um dia, vários anos depois, regressei aquele lago com que sonhara todas as noites desde que partira.
Ao chegar notei que a vegetação em redor era agora muito mais densa e só usando a minha espada consegui avançar lentamente. Os meus olhos viram, e não consegui fugir de uma realidade que me fez parar e cair de joelhos.
A torre, outrora pequena e ridícula, era agora imponente, passando as nuvens em altura e desafiando os ventos que a agrediam. Estava envolta num emaranhado de plantas trepadeiras espinhosas, de aspecto velho e aterrador.
Olhei para o alto, mas era impossível saber se a minha Princesa continuava na varanda, pois a névoa era espessa e negra, perturbando a minha visão.
Furioso, desembainhei novamente a espada, e comecei a cortar as trepadeiras e espinhos que envolviam a torre. Durante horas, cortei e arranquei com as próprias mãos, aquela Natureza feia que me impedia de subir ao meu destino.
Por fim, completamente exausto, e perto do descontrolo, larguei a espada e iniciei uma escalada de impulso, ignorando a dor profunda que sentia enquanto os espinhos rasgavam a minha roupa e pele, a cada metro que avançava.
Estava já muito perto da varanda, mas não conseguia ver o que me esperava.
Por fim, consegui alcançar o topo da torre e parei durante uns segundos para recuperar, em vão, o fôlego e as forças.
Então, sem que pudesse resistir, ou agarrar-me a qualquer esperança, escorreguei e mergulhei com vertigem para o chão distante. Fechei os olhos e desejei que tudo acabasse depressa. Talvez, a sorte me fizesse cair em cima da espada que deixara cravada na terra molhada. Morreria de forma mais digna e combatendo, não contra dragões ou negros exércitos, mas por algo igualmente nobre.
Foi com espanto que o meu mergulho se transformou num pequena queda, incapaz de provocar um simples arranhão. Sem que percebesse, a torre voltara ao seu tamanho inicial, pequena e já sem quaisquer névoas a envolvê-la.
Estava deitado de costas num manto daquelas folhas que enchiam agora o lago por completo, à excepção de uma ínfima parcela que deixava a água brilhar reflectindo a luz do Sol. Esse espaço por preencher, tinha as medidas exactas de uma única folha e esperava que a mesma brisa mágica, o cobrisse finalmente.
Levantei-me e olhei para a varanda, onde encontrei a Princesa dos meus sonhos, desta vez sorrindo e sem procurar fingir que me observava. Nos cabelos não restavam folhas, mas nas mãos guardava apenas uma, que poderia caber na perfeição no último espaço que restava no lago.
Era a mesma folha que lhe tinha deixado quando ali estivera e em que agora recaía uma imensa responsabilidade.
Sorri e afastei-me um pouco, para me sentar numa sombra calma não muito longe dali.
Esperaria tranquilo, com a certeza de que o destino depressa revelaria os seus segredos, afastando ventos difíceis e tempestuosos.
Dormi com um sorriso mais doce e aguardei a minha sorte…

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Uma fábula...

"Procuramos um sonho durante a vida. Quase sempre sem forçar, vemos dimensões e corpos estranho que tentam tomar este espaço. Mas não é por isso que devemos quebrar.
Cada sonho é de uma só pessoa, que o alimenta e faz crescer com doçura. Profundamente errada, é a tentativa de os roubar ou sequer partilhar, mesmo que com guerreiros do mesmo exército.
Livres são os que sem esforço vêem as suas asas crescerem, rompendo sem dor a pele que as abriga, e voam a distância segura do Sol, para de noite tocarem as estrelas."

"Foi quase sem perceber que nos olhámos e descobrimos os mesmos pensamentos que trazem insónias e corações acelerados."

Às vezes, quando o sono teima em chegar e começo a ter dores de inquietação, entro num estado de meia lucidez que está longe de uma calma que esperava para estas situações.
Recorro a técnicas inventadas para aproveitar este tempo, que era de repouso, para sonhar e construir outras realidades. Mas nem sempre com sucesso. Por vezes o torpor traz sentimentos e confusões desconfortáveis, que sinceramente me magoam.
Gratos são os momentos em que a necessidade de dormir não é imediata e posso simplesmente deixar-me voar sem preocupações de rotas ou sustentações mecânicas.
Pena ser raro, mas talvez por isso tão precioso, o estado em que quase se sonha acordado e que, estando num semi-controlo da fantasia, esta é sentida como realidade.

Querendo partilhar o que me pertence por direito, aborrece-me profundamente a técnica literária e a obrigação de um enredo bem construído para quem lhe dedica atenção. É só uma questão de paciência! Com as palavras e frases surgirá, espero eu, uma lógica para tudo isto.
Tenho dormido mal! Parece-me um excesso de energia acumulada, de pensamentos a mais para um cérebro apenas humano que não processa a velocidades tão elevadas. Mas conheço as razões para tal, ou pelo menos algumas!

Há uns anos, noutras fases, mas com os mesmos sintomas, descobri numa noite mal dormida, a razão de ser das insónias.
O mistério, encontrei-o numa fábula conhecida por poucos, e mesmo esses apenas porque lhes contei.
De Anjos da Guarda sei pouco, a não ser que o meu é poderoso e muito trabalhador. O que conheço bem são Duendes!
Sim…Duendes! Pequenos e verdes, por força de livros infantis e de estereótipos impossíveis de desalojar. E ainda bem!
O que os livros não me contaram, foi que todos nós temos um Duende! É verdade, cada alma que conhecemos tem um Duende, ou cada Duende recebe uma alma, dependendo da perspectiva. Não é importante!
Ao contrário do que me disseram, eles não vivem nas florestas Irlandesas, nem mesmo nas mais verdes e húmidas. Nem sequer vivem neste planeta que nos abriga. Vivem num outro, que não é muito diferente, a não ser pelo verde, muito mais presente e luxuriante. Aí vivem os nossos Duendes!
Há no entanto uma característica desse Mundo que convém reter. Tudo está ao contrário!
Mas não encaremos este facto em termos físicos. Não está tudo de pernas para o ar.
É no tempo que encontramos as diferenças. Quando o nosso dia nasce, o deles está a acabar e a nossa Lua só aparece depois de acordar o seu amigo Sol, que vive nesse Mundo. Até aqui tudo bem. O mesmo acontece em diferentes locais da Terra, mas como disse isto é uma fábula e nelas não existem as preocupações de Galileu ou Copérnico, nem se perde tempo a justificar realidades.
Passemos então ao principal. Os nossos Duendes!
Quando nascemos, julgamo-nos sozinhos e sem direito a protecção divina, que não a das religiões dos homens. Mas não! Essa protecção existe!
Cada vez que um bebé vem ao Mundo, existe um Duende que lhe corresponde. Mas não é um Duende recém nascido, é antes um ser velho, muito velho, que cuidará da nossa infância.
Lembram-se do que contei? Naquele Mundo tudo é ao contrário. Os Duendes começam, perdoem-me, mas não sei por que artes, por ser muito velhos e com o passar do tempo vão ficando mais novos. E é aqui que voltamos às insónias.
É que estes Duendes têm uma função. Proteger o nosso sono! Para que cada um de nós possa dormir, o seu Duende tem que ficar acordado durante todo esse tempo. Se ele se descuidar e adormecer alguns segundos a meio do dia, acordamos nós durante a noite sem perceber bem porquê.
A Natureza, no entanto, é sábia e ao gerir o equilíbrio destes Mundos traçou um plano eficaz. Os idosos dormem pouco e os Duendes muito velhos, quase nada. Esta aparente contrariedade é muito útil para quem tem que proteger os sonos prolongados de um bebé.
Ao contrário, quando os Duendes ficam mais novos, não aguentam tanto tempo sem dormir, e os nossos idosos passam a estar mais horas de olhos abertos, julgando-se muitas vezes com medo de dormir…e não mais acordar.
E foi ao conhecer esta história que percebi!

As minhas constantes e terríveis insónias! Tinha finalmente percebido ao sua causa!
Durante alguns anos, enquanto estudava, apenas porque me habituei a fazê-lo, troquei de horários. Em meses seguidos, deitava-me quase de madrugada e dormia até ao Sol já estar bem alto.
Sem perceber, obrigava o meu Duende a um esforço insuportável. Tinha que se manter acordado até horas em que deveria estar a sonhar (é assim que os Duendes recuperam forças) e dormir durante o dia com um Sol que no seu Mundo é ainda mais forte e radioso.
Ele cumpriu a sua função até ao limite das forças, mas acabou por ceder. E passou então a desmaiar de sono e de cansaço em alturas que deveria estar acordado, para que eu pudesse dormir. E então chegaram as insónias!
Hoje, cuido muito mais do meu Duende e percebi que a protecção não é apenas sua função.
(In)felizmente, outras causas nos levam o sono, e contra essas os Duendes nada podem fazer, ou melhor, quase nada! Falta apenas um segredo na minha fábula…Todos os Duendes se conhecem, mas apenas entre alguns existe uma relação forte e de união. Na sua ligação poderá estar a resposta às minhas questões. Continuo à procura…

domingo, fevereiro 25, 2007

O lago...

Conheço uma princesa. Tem longos cabelos muito claros que chegam a envergonhar o Sol, quando este espreita pela manhã.
Foi há muitos séculos que pela primeira vez a vi, numa torre que não era muito alta, mas parecia difícil de alcançar. Estava cansado, pois cavalgava há muitas horas e a poeira fazia-me lacrimejar com ardor.
Parei junto a um pequeno lago perto da torre e fiquei sentado a olhar. A princesa não parecia muito assustada, nem à procura de um herói que a resgatasse daquela prisão frágil e gasta pelo tempo. Não era normal! Qualquer donzela tem sempre um ar delicado e de quem suplica por um nobre cavaleiro que a salve do seu cativeiro. Mas ela não. Estava encostada numa espécie de varanda, claramente fingindo que não me via, enquanto soltava as folhas que decoravam o seu cabelo, para planarem suavemente até perto do lago. Algumas chegavam mesmo a cair dentro de água, mas a maioria não voava tão longe.
A minha jornada não tinha ainda um objectivo conhecido, por isso podia acampar ali mesmo, guardando a minha princesa.
Passaram três dias e três noites e ela olhou uma única vez para mim, quando uma das folhas, que já escasseavam, ajudada por uma brisa mágica atravessou o lençol de água e parou perto das minhas mãos. Peguei-lhe devagar e olhei para a torre, ainda a tempo de ver um sorriso logo escondido.
Era tarde e o mesmo Sol envergonhado descia por detrás de uma montanha. Deitei-me também segurando a folha que me fora oferecida e desejei muito poder sonhar nessa noite.
Ao primeiro sinal de dia, levantei-me rapidamente, peguei na folha, e dirigi-me à torre. A princesa lá estava como em todos os dias, parecendo não me ver, mas tudo iluminando de tanto que os seus olhos brilhavam.
Pensei falar, cantar, até mesmo trepar a ridícula torre que podia cair com um sopro fraco e desinspirado.
Aproximei-me o mais que pude e perguntei-lhe se queria vir comigo!
Ela sorriu e respondeu:
- Quando todas as folhas do meu cabelo chegarem ao lago!
Subi para o meu cavalo, ficando quase à altura da varanda, que parecia ainda mais pequena. Entreguei-lhe a folha que tinha guardado, para que os nossos dedos se tocassem, mesmo que ao de leve. Despedi-me e parti.
Olhei uma última vez para trás e reparei que o lago estava mais preenchido do que tinha percebido. Não consegui decidir se voltaria aquele lugar…

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

A Montanha da Lua...

“Diz a lenda que a Montanha da Lua pode aparecer em qualquer lugar. No meio de um deserto ou no fundo do lago mais negro. A sua escalada obriga-nos a enormes quantidades de ar e a descida ao esquecimento de qualquer cuidado.”

Uma voz rouca sempre intriga quem se preocupa com pormenores pequenos e sem razão para existirem. Ao ouvi-la perguntamos se será real ou um pouco fingida na sua nascença. Mas ela não tinha esse tipo de voz. Era calma, embora tivesse abandonado um som cristalino que agora entendo ser mais sonhado que possível.
Tinham passado três semanas até ganhar coragem. Tinha passado muito mais enquanto imaginava os sorrisos que poderiam despertar.
Naquela tarde, já cansado, consegui por fim chegar perto dela. Uma janela tinha aberto para que o meu cuidado pudesse guardar e finalmente caminhei os últimos passos. Não senti a montanha...e também não a sinto agora.
Mas ela existe e subir ao topo não seria tarefa fácil. É muito frustrante quando vemos uma linda paisagem que pensamos poder fazer parte da vista do nosso quarto. E quando finalmente espreitamos existe uma enorme montanha branca que tapa o horizonte. Chamam-lhe a Montanha da Lua, porque a sua sombra não deixa passar a luz do dia e nos faz encolher, sentirmo-nos sem força para continuar, quase desistindo.
Não é essa a opção pois a escolha foi criada artificialmente, sem certezas e com muitas dúvidas de autenticidade.

Resta-me a respiração forte e uma longa subida. Depois do seu cume há uma descida calma e sem mais perigos...

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

"O meu outro eu"...



Antigamente chamava-me miak e escrevia no "Duende Feliz".

http://oduendefeliz.blogspot.com/

Passa por lá, por favor.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Um dia...

Um dia, um rapaz passeava junto ao mar.
Era Primavera e o ar salgado deixava-lhe um sorriso na face...
Sem perceber caminhou durante séculos e se a terra fosse mesmo redonda por certo não ia parar.

Mas à medida que a Lua murmurava ao Sol para se despachar, começou a levantar-se uma brisa...
Não era uma brisa normal. Parecia que falava baixinho.
Falava com ele mas sem palavras que pudesse ouvir.
Mesmo assim sentia algo...arrepios, medo, e quase fugiu correndo...

Tinha que ser forte....
Nem com todos a brisa fala...e já que o escolhera, devia tentar ouvir.
Quase sem pensar, entrou pela maré...
Acariciou as ondas envergonhadas e sorriu para o mar...

O mar sorriu também, para depois soltar uma enorme gargalhada que engoliu o rapaz...
Num turbilhão de água sentiu o fôlego a fugir, e gritou pelo ar que lhe era roubado...

Por segundos pensou que dormiria...para acordar num mundo distante, perto de uma sereia.
Com conchas coloridas e mantos verdes de saudade...

Mas não!!
Apenas rebolou na água morna...
Bebeu litros, espirrou sofrimento...
Durante uma hora pontapeou a morte sem chorar uma lágrima...

Saiu voando então...
Aterrou com estrondo na areia, e ficou parado a olhar o mar...
As conchas eram brancas por toda a parte...
Não havia sereia, nem um mundo diferente...

Escolheu por fim a sua realidade, porque se o senhor mar não o aceitou, alguma razão devia ter...

sábado, janeiro 13, 2007

A lucidez...

Tentem ficar lúcidos! Tentem fazê-lo no meio da raiva latente que só não deixo chegar porque me faz sofrer...
Tentem ser pais e amigos e empregados e deixar que a vida não se transforme numa confusão de porquês, de medos e ânsias e meios caminhos sempre andados em direcção ao disparate. Como evitar começar a esmurrar todas as paredes e outras caras, derreter à pancada aqueles idiotas sorrisos que me agoniam durante parte do dia, aquela em que não estou só. Porque razão não há de aparecer não uma princesa, que dessas fugirei, mas uma simples rapariga de um sonho mais calmo e lúcido? Porque a tranquilidade é tão escassa e não permanece anos de seguida?

terça-feira, janeiro 09, 2007

Uma ilusão...

Alguém me disse um dia que a paixão não passa de uma ilusão. Por ser verdade, é a mais bela das sensações!

Tinha conseguido encontrar alguma calma. Não era constante. Por vezes lutava por fugir-me. Mas por agora sossegava no presente.
E então ela apareceu! Em noite fria e sem expectativas, precisei de três segundos para me apaixonar, e das restantes horas para ter a certeza.
É fácil falar com quem amamos ou pelo menos para mim assim foi. Não planeei conversas ou temas originais. Saboreei a paz em não ter que inventar personagens ou estados de alma, porque na verdade era feliz. Fugi a ébano imaginado e a alcóol que não precisava, para manter intactos sentidos e olhares. Não programei despedidas e deixei que a noite terminasse sem que pudesse saber.
Voltei para casa só com incertezas e tentando não me iludir, mas sabendo que o faria. Decidi permitir um sonho moderado, que me fizesse sorrir, mas me impedisse de chorar. Quando estamos sós durante um tempo, interrogamos o coração. Queremos saber se está bem, se necessita de algo. Dobramos o queixo e falamos para baixo, quase em silêncio. O peito que o guarda amortece as palavras que questionam fragilidades. Será a solidão, mesmo que confortável e consentida, um qualquer antídoto da razão?
Tudo parecia encaixar. Uma harmonia suave que sonhei pudesse dormir a meu lado.
Então deixei impulsos, desta vez contidos, levarem-me à escrita. Palavras simples que possam abraçar a tecnologia de um email, com o romantismo perdido em transferências de dados. Poucas linhas para que algumas mais fossem enviadas, acompanhadas de banda sonora quase original.
A partir daí o sonho mudou. Passou a ser com a resposta e o devolver de empatia, já então questionada. Impossível! Não podia ser caso isolado. Para estas mãos existem outras que esperam…que têm de sentir o mesmo, a tão grande vontade de apertar, de finalmente encontrar.
Esperei três dias, evitando pensar muito, mas deixando-me partir em outras tantas viagens.
A resposta chegou enfim! Respirei fundo e preparei-me para abrir a mensagem. Parei uns segundos ao notar o título – Re: Olá…
Abri os olhos e li então o seu conteúdo. Dizia apenas:

- Quem és tu?


Voltei a fechar os olhos…e sorri sozinho.

segunda-feira, janeiro 01, 2007

O mesmo que eu...

“Um violino traz-me sempre a tua memória. Para pensar à chuva, quando me afogar em muitos risos.”

Era assim que esta linda mulher encerrava pensamentos antes de dormir. Lembrou uma última vez os seus olhos, antes de cair num sono profundo. Sonhou por séculos, questionando se estaria só...se o que entendeu era igual ao reflexo de um espelho pouco mágico e gasto pelo tempo.

Eram lindos os seus sonhos. Neles as mãos eram tudo. Com elas falava e escrevia, lembravam um toque delicado e não tinha medo de apertar. Afinal era o toque que mais recordaria.
Não tinha passado muito tempo! Achava ainda sentir o seu cheiro. Queria dormir...mas não podia.

Ele sorria muito...não parava de recordar cada instante...e sorria mais.
Felicidades construídas de ilusões tão doces e frágeis, mas sem obrigação de serem verdadeiras. Existiriam para sempre.
Lembrou também o toque, roubado e consentido...recordou os sons e tudo, que eram de uma íntima suavidade.

Em outras alturas desesperara por não saber melhor, por querer demais. Agora sabia mais e vivia menos, mas sonhava de forma igual.

Ali ficaram tantos segundos, em pensamentos cruzados e distantes na cidade. Lembraram ao mesmo tempo, a incerteza que não terminou. Quando fechavam os olhos viam-se a voar outra vez...as mãos juntas.

“Às vezes não é fácil encontrar a calma que me traz de volta ao mundo. Mesmo que sem perceber onde parei, onde amei, onde teria a certeza de que escreverias...o mesmo que eu...”